Originalmente associado às tradições dos celtas - povo de origem indo-européia que habitava extensas áreas da Europa pré-romana -, o druidismo é uma religião de natureza pagã. O termo “pagão” tem origem no vocábulo latino “paganus”, que era usado para designar alguém que nasce no “pagus” (o campo, a Natureza). Em termos espirituais, pagão é aquele que acredita na sacralidade da Natureza e de todas as formas de vida. Exemplos de povos pagãos da antiguidade são os gregos, os egípcios, os sumérios, os germânicos e os persas - todos com diversas deidades em seus panteões associadas à Natureza, com deuses e deusas que personificavam as grandes forças naturais do mundo em que vivemos.
Os druidas, sacerdotes dos celtas, portanto, também eram pagãos - como são pagãos atualmente os povos indígenas da Amazônia, os maori da Nova Zelândia, os aborígenes da Austrália, enfim, praticamente todos os povos cujas religiões tenham como foco fundamental a sacralidade da Natureza.
Praticamente tudo o que sabemos sobre os druidas antigos nos foi relatado por historiadores gregos e romanos que tiveram contato com os celtas nos séculos que antecederam a era cristã. Políbio, Amiano Marcelino, Tito Lívio, Julio Cesar e Plínio o Velho (entre muitos outros) escreveram sobre os druidas, descrevendo-os como poderosos sacerdotes, sábios e juristas, mas também como inspirados poetas, místicos e conselheiros. Além de terem sido os sacerdotes dos povos celtas, os druidas desempenhavam todas as funções acima citadas. Foi por isso que Julio Cesar afirmou em seus Comentários da Guerra na Gália que, para se tornar um druida, um jovem candidato deveria dedicar de doze a vinte anos de estudos, dada a enorme quantidade de informações que um druida precisava absorver sobre diversas disciplinas.
Um druida deveria ser tão versado nas leis de seu povo quanto hábil em contar os mitos e lendas que formaram aquele povo. Um druida deveria ser sábio o bastante para aconselhar os reis, como também deveria ser sensível o bastante para praticar a cura no sentido mais amplo dessa palavra (não apenas de curar doenças), um elemento fundamental dos deveres dos druidas, como vemos em uma tríade druídica moderna, que diz:
“Três deveres de um druida:
* curar a si mesmo;
* curar a comunidade;
* curar a Terra.
Pois se assim não fizer, não poderá ser chamado de druida."
Versos como estes eram usados pelos celtas para facilitar a memorização de diversos níveis de conhecimento - da sabedoria do dia-a-dia às suas leis mais elevadas, das regras sociais à mitologia mais profunda. Isto porque os celtas não usavam a escrita para transmitir seu conhecimento, valendo-se da tradição oral como meio de preservação de sua sabedoria. Obviamente, muito se perdeu com o passar dos séculos, mas a essência do druidismo, seus conceitos fundamentais e suas crenças, permaneceram imutáveis até os dias de hoje.
Depois das invasões romanas na Gália e Grã-Bretanha, foi somente na Irlanda e no norte do País de Gales – territórios jamais conquistados pelas legiões romanas – que o druidismo permaneceu vivo. Graças aos textos oriundos dessas duas regiões, podemos hoje contrapor as informações contidas nos textos clássicos aos usos e costumes dos druidas preservados através de diversas lendas e contos míticos.
Desses textos, percebemos que o druidismo é uma religião que nos traz respostas pontuais a questões prementes do mundo moderno, como a honra aos nossos ancestrais, e o respeito e a integração do ser humano com a Natureza.
Quando o cristianismo chegou à Irlanda, logo se fundiu ao druidismo que lá ainda existia. O resultado foi o chamado Cristianismo Celta – mais místico, mais profundo e mais filosófico do que o cristianismo de Roma (mulheres eram ordenadas e o uso da magia era freqüente). Na Idade Média, contudo, o poder e a intolerância dos papas não mais suportou as diferenças e a independência do cristianismo irlandês. Foi imposto então, através da força, o cristianismo ortodoxo romano, que sufocou quase que por completo a ancestral sabedoria dos druidas celtas.
O segredo do druidismo é a integração da alma do druida com a Natureza, do druida com outra pessoa, do druida com o mundo em que vive, com seu trabalho, com seu alimento. Eis outro ponto chave do druidismo: o animismo, ou seja, a crença de que tudo tem alma (anima) ou espírito. Assim como outros caminhos pagãos de cunho xamânico, o druidismo acredita que uma pessoa tem alma, bem como todos os animais, todas as árvores, enfim, todo ser animado, que vive.
Aqui cabe um parêntese sobre os objetos inanimados e também sobre elementos da paisagem (rios, montanhas, etc). Muitos questionam se no conceito animista os objetos e a paisagem também teriam alma/espírito. Uso as palavras do bardo Wallace William (Ramo de Carvalho) para explicar: “Isso não quer dizer que TUDO seja provido de espírito. Isso quer dizer que tudo PODE ser imbuído de espírito. Não é toda espada que é imbuída de espírito, mas uma ou outra pode ser. Não é toda pedra que é imbuída de espírito, mas algumas são. Não é todo lugar que é imbuído de espirito, mas alguns lugares especiais o são. O lugar se torna imbuído de espirito devido à sua constante ligação com o sagrado. O mesmo vale para o objeto. Por isso não é uma pedra que é cultuada per se, mas sim o seu espírito, se ela for imbuída disso, que recebe a nossa comunicação.”
Tudo é energia e alma é energia. Se tudo tem alma, tudo tem vida; e tudo que tem vida é sagrado. O que é sagrado deve ser respeitado e honrado. Ao interagir com o mundo de alma para alma, o druida estabelece uma conexão espiritual que permite o fluxo da awen (“espírito que flui”).
